A moda nem sempre existiu, ela surgiu no final da Idade Média, com sua fase inaugural na metade do século XIV, e teve seu auge no Renascimento. Só podemos classificar como “moda” a partir do momento em que a efemeridade é constante, as fantasias e exuberâncias aparecem e a sociedade se adapta aos novos conceitos criados. A moda é um sistema inseparável do excesso, da desmedida, do exagero. O retardado princípio de moda deve-se, principalmente, ao hiper conservadorismo de uma sociedade primitiva, que era agarrada a costumes e valores irredutíveis de uma época em que o novo era abominado e temido. Moda não é somente vestuário, seu conceito é mais amplo; paralelamente, outros setores também são abrangidos, como o mobiliário e os objetos decorativos, a linguagem e as maneiras, os gostos e as ideias, os artistas e as obras culturais etc; mas, de fato, foi nas roupas que encarnou mais vigorosamente o seu conceito maior.
A partir do século XIV, há uma nítida diferenciação do vestuário masculino para o feminino; curto e ajustado para o homem, longo e justo para a mulher. Essa foi a grande Revolução do Vestuário que lançou as bases do trajar moderno. Entre os anos de 1340 e 1350, as mudanças vão aumentar, as variações vão aparecer mais frequentes, mais extravagantes, mais arbitrárias, com formas visivelmente fantasiosas e decorativas, definindo o próprio processo da moda. A mudança não será algo acidental e raro, torna-se uma regra permanente dos prazeres da alta sociedade. A mutabilidade da moda se impôs como um fato evidente, em que o antigo, o “passado”, vira alvo de denúncias caluniosas.
A moda é inconstante, mas nem tudo nela muda. A efemeridade está mais diretamente relacionada aos ornamentos e aos acessórios, às sutilezas dos enfeites, das amplitudes e das texturas, enquanto a estrutura do vestuário e as formas gerais permanecem placidamente estáveis. Assim, são os “pequenos nadas” que transmitem o valor de estilo e classificam ou desclassificam as pessoas que os adotam. A sutileza da arte da moda. As inovações são escassas, por isso são tão valiosas, reconhecidas e admiradas, o que comumente acontece são as variações de detalhes, “releituras”, repaginando assim o cenário da moda.
“Na escala da aventura humana, o surgimento da temporalidade breve da moda significa a disjunção com a forma de coesão coletiva que assegura a permanência costumeira, o desdobramento de um novo elo social paralelamente a um novo tempo social legítimo. […] enquanto nas eras de costume reinam o prestígio da antiguidade e a imitação dos ancestrais, nas eras da moda dominam o culto das novidades assim como a imitação dos modelos presentes e estrangeiros – prefere-se ter semelhanças com os inovadores contemporâneos do que com os antepassados.” – segundo Gilles Lipovetsky, em “O Império do Efêmero“.
Para finalizar o conceito, a moda é um fascínio que atrai não só pela beleza, pela inteligência da criação ou pela sua popularidade, mas ela faz parte do nosso ser, é um instinto humano assim como o individualismo, por exemplo, está dentro de nossas almas, seu início era questão de tempo e sua renúncia é, absolutamente, insuportável.
* Este artigo é uma reflexão da autora desta matéria, Marina Khouri, sobre os conceitos pregados por Gilles Lipovetsky em sua obra mais popularizada, “O Império do Efêmero” (Companhia das Letras, 2007).